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Hoje a noite foi longa,não conseguia adormecer e nesse tempo veio á memória o dia do diagnóstico, aquele dia em que tive a certeza que a minha vida iria mudar.
Quase que presentindo o que viria, não quis que o marido me acompanhasse á consulta e fui com a minha irmã, a ansiedade era enorme, ao entrar na sala onde o médico me aguardava senti um arrepio acho que proprio de quem espera por algo incerto ou não...
e o sorriso habitual com que ele sempre me recebia já não era o mesmo.
Os minutos que se seguiram enquanto ele folheava o meu processo acho que para fazer tempo,pareciam horas e o meu estado de ansiedade fez com que eu lhe perguntasse sem rodeios " então Dr. o o que deu a Biopsia desta vez?"( já era a 2ª porque a 1ª tinha dado negativo)foi quando ele sem coragem de me dizer o resultado virou o ecrã do PC para que eu pudesse ler, mas não foi necessario as lágrimas da minha irmã ditaram o resultado.
O meu mundo caiu, a partir daquele momento tive a certeza que a minha vida nunca mais seria a mesma, o primeiro pensamento que tive foi de que iria morrer..
A palavra Cancro é assustadora, e a mim sempre me assustou imenso, mas tambem sempre pensei que ela nunca viesse bater na minha porta, mas veio e não bateu, entrou sem pedir licença para o fazer.
Depois de varias horas em que chorei, gritei e lamentei a minha sorte, numa outra sala do Hospital,onde fui acarinhada por uma equipa de enfermeiras, e onde me explicaram o que teria de fazer a partir daquele momento,saí de lá com uma certeza, não seria um cancro de mama que me iria derrubar!!
Nesse mesmo dia mês de Natal,depois de deixar a minha mana em casa, ainda fui ao Colombo encontrar um pequeno grupo de amigos com quem tinha marcado um lanche,
LUA, PRL, VIRIATO, o trio benfiquista.
Fiz os possiveis e impossiveis para não dar a entender o meu desespero, ri por fora enquanto o meu coração sangrava por dentro,tentei aproveitar ao máximo o encontro, e não queria de maneira alguma estragá-lo com o meu problema, e consegui porque quem olhasse para mim não diria que poucas horas antes eu soube que tinha cancro.
O pior viria depois, como contar á familia, durante o dia o marido já tinha telefonado para saber o resultado, e eu tinha dito que estava tudo bem, não era por telefone que ele iria saber, quando saiu do trabalho passou pelo Colombo para me levar para casa, e pedi-lhe para parar no caminho antes de lá chegar.
O choque foi muito grande, tambem ele não estava preparado para uma noticia dessas, mas o pior viria depois, como contar ao nosso filho.
Nesse dia fomos jantar em familia em casa dos meus pais, para dar a noticia a todos,novamente durante o jantar eu demonstrei alegria, mesmo quando a minha mãe insistia em perguntar o resultado, eu dizia esta tudo bem.
Depois do jantar reuni todos na sala e começou a minha palestra.
Claro que foi o desespero de todos, mas o meu filho foi o que mais me assustou, o choque foi muito grande e ele ficou parado de olhos arregalados sem pestanejar, acho que naquele momento o seu coração parou de bater,não disse uma palavra,foi preciso sacudi-lo, entrei em pânico, naquele instante pensei que o ia perder, foi o pior momento da minha vida, mas foi tambem a partir dali que eu coloquei na minha mente, que iria sobreviver, custasse o que custasse.
Os dias que se seguiram foram terriveis, ninguem dormia ca em casa, o meu filho só saia para trabalhar e regressava logo, não queria sair com os amigos, com a namorada, só queria estar perto de mim, deixou de viver a vida dele para viver a minha, e isso não era justo, foi dificil fazer entender que eu não iria morrer, que a vida continua, que há vida para alem do cancro, passado muito tempo a vida voltou ao normal, dentro de algumas limitações, mas voltou.
Todos estes meses têm sido dificeis, a cirugia, os tratamentos dolorosos, a queda de cabelo, tudo isso mexe com as minha emoções, mas eu tal qual uma arvore em dias de tempestade, tenho abanado e muito, mas não caio e nem irei cair, os safanões têm sido fortes, muito fortes a tal ponto de chegar ao desespero e desejar a morte, mas logo de seguida estou de pé novamente e pronta para a luta que está perto do final.
Eu prometi á minha familia que tem sido o meu suporte, de que nada me iria derrubar, e tenho de cumprir.
Nestes momentos é que nós descobrimos o quanto somos fortes, eu descobri forças que jamais imaginava que tinha, onde as fui buscar?? não sei, mas sei que as tenho e muito.
Agora até pequenas coisas que eu julgava serem insignificantes, têm para mim outro valor, passei a ver a vida de uma outra maneira, mudei em vários sentidos, e sei tambem que nunca mais serei a mesma.
Tuo isto serviu tambem para descobrir os verdadeiros amigos, alguns se foram, os verdadeiros ficaram e novos entraram na minha vida como uma benção.
Estou perto do final, falta uma sessão de quimioterapia, e de seguida as de Radioterapia, espero até ao final deste ano, que tudo volte ao normal, que o maldito já tenha sido despejado de vez.
Espero que todo este meu desabafo sirva para encorajar muitas mulheres que ainda estejam na fase inicial, naquela fase em que tudo parece negro,aquelas que (como eu) ainda não descobriram que por tras das nuvens tambem existe o sol.
Temos de ter sempre em mente que o cancro tambem pode morrer, que ha vida para alem dele, que podemos ser pessoas normais e eu sinto-me MULHER em todo o sentido, e dizem que sou uma grande mulher, começo a acreditar que sim (lol).
Todo este sofrimento serviu para que eu me descobrisse a mim própria,estou mais sensivel, mais emotiva, choro com mais facilidade, e sofro com pequenas coisas que por vezes não deveria, mas não consigo evitar...
È assim, mas a vida continua, há que vivê-la da melhor maneira possivel, nunca mais vou deixar para amanhã o que poderei viver hoje,vou viver um dia de cada vez como se fosse o ultimo mas sempre em prol da minha felicidade e dos que me rodeiam....
Maguie